Uma equipe de cientistas da Universidade de São Paulo (USP) descobriu que a forma grave da Covid-19, causada pelo vírus SARS-CoV-2, tem relação com o desequilíbrio em uma importante via de sinalização do sistema imune mediada por moléculas de ATP (trifosfato de adenosina).
Os pesquisadores perceberam que, além de apresentar maiores concentrações de ATP no sangue, os pacientes que desenvolveram a forma grave da doença tinham menor quantidade de adenosina, molécula gerada a partir da degradação do ATP. Os resultados foram publicados no periódico Frontiers in Immunology.
O ATP é uma molécula presente em altas concentrações no citosol, produzida através da respiração celular, e que pode ser liberada no espaço extracelular mediante ativação ou morte celular. Assim, o ATP extracelular pode atuar como um sinal de “perigo”, promovendo a ativação de células imunes e induzindo respostas pró-inflamatórias.
Por outro lado, este ATP extracelular pode ser convertido em adenosina por meio de diversas enzimas presentes na membrana de células do sistema imune (ectonucleotidases) e pode promover imunossupressão através da inibição da proliferação e função de células T e indução de citocinas anti-inflamatórias.
Para analisar melhor o papel do ATP na gravidade da Covid-19, os pesquisadores dosaram a quantidade de moléculas de ATP e de adenosina em amostras de sangue de 88 pacientes com Covid-19 grave. As amostras foram coletadas entre 2020 e 2021 e, assim, nenhum dos participantes havia sido vacinado.
Eles observaram uma relação positiva entre a maior quantidade de ATP extracelular e maior gravidade da doença. Isso se deve ao fato de que, nestes pacientes, as ectonucleotidases estavam menos expressas em suas células imunológicas.
Os pesquisadores também investigaram possíveis alterações em células do sistema imune. Eles observaram que nas amostras de sangue de pacientes graves, além da quantidade de células B estar diminuída, elas também expressavam menor quantidade das enzimas CD39 e CD73, o que contribui para uma reduzida taxa de degradação do ATP e, por consequência, para a menor geração de adenosina – o componente anti-inflamatório que tentaria regular essa resposta.
Por fim, os pesquisadores realizaram um experimento in vitro, que consistiu na administração de ATP para células B isoladas de pacientes com Covid grave e controles saudáveis. Desse modo, eles descobriram que as células B dos pacientes graves geram menos adenosina, quando comparadas às de controles saudáveis, resultando em menor produção da substância anti-inflamatória.
Por fim, os cientistas ainda não sabem se esta alteração no metabolismo do ATP é causa ou consequência da resposta inflamatória exacerbada ao SARS-CoV-2, e que, para isto, mais estudos são necessários.
Referência:
Pietrobon AJ, Andrejew R, Custódio RWA, Oliveira LM, Scholl JN, Teixeira FME, de Brito CA, Glaser T, Kazmierski J, Goffinet C, Turdo AC, Yendo T, Aoki V, Figueiró F, Battastini AM, Ulrich H, Benard G, Duarte AJDS, Sato MN. Dysfunctional purinergic signaling correlates with disease severity in COVID-19 patients. Front Immunol. 2022 Sep 30;13:1012027. doi: 10.3389/fimmu.2022.1012027. PMID: 36248842; PMCID: PMC9562777.
Fonte: Academia Médica